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sexta-feira, 19 de junho de 2015

Uso de drogas sintéticas


O mercado de drogas ilícitas está cada vez mais diversificado. Não param de sintetizar substâncias que mimetizam e potencializam os efeitos da maconha, cocaína ou heroína, e escapam dos testes laboratoriais e dos órgãos de repressão.

Os fabricantes dessas drogas adotam a mesma estratégia da indústria farmacêutica: vasculham a literatura científica atrás de moléculas de interesse comercial. Só que, em vez de pesquisarem tratamentos para enfermidades que afligem seres humanos, procuram nas publicações especializadas os compostos abandonados por causar dependência química e alterações da percepção e do estado mental.

Moléculas com tais propriedades são sintetizadas em laboratórios clandestinos, instalados em fábricas antigas que produziam medicamentos e perfumes na Índia, China e Paquistão. O produto final é entregue aos traficantes em cápsulas, ampolas para injeção ou na forma de pó para ser aspirado ou fumado. O nome popular é escolhido de acordo com a cultura underground local: Miami Ice, MDPV Boliviano, Meow Meow, K2, Spice.

A Europa tem sido o mercado mais ativo. Somente no ano de 2012, o Centro Europeu de Monitoramento de Drogas de Adição detectou, nas ruas, 73 drogas psicoativas anteriormente desconhecidas.

No Reino Unido, o problema é tão grave que os serviços de repressão ao tráfico decidiram testar amostras de urina colhidas aleatoriamente. No decorrer de apenas seis meses de 2014, foram identificadas 13 novas substâncias psicoativas, na urina recolhida de banheiros portáteis do centro de Londres.

Nos últimos anos, um número crescente de drogas sintéticas invadiu o maior mercado consumidor do mundo, sem passar pelo velho Continente. Desde 2009, o DEA, a agência dos Estados Unidos encarregada da repressão às drogas ilícitas, identificou mais de 300 substâncias sintéticas euforizantes apreendidas em cidades americanas.

A maior parte é derivada dos canabinoides, classe à qual pertencem o principio ativo da maconha e vários compostos de interesse medicinal.

Em segundo lugar, aparecem as catinonas sintéticas, obtidas a partir do alcaloide extraído da planta Catha edulis, cujas folhas são mascadas há centenas de anos por populações tradicionais da África Oriental e da Península Arábica, interessadas em seu efeito estimulante, similar ao das anfetaminas. Versões modernas e seguras das catinonas são encontradas em alguns medicamentos, como a bupropiona.

Na produção clandestina, os químicos modificam a molécula de catinona ou de canabinol introduzindo um radical metila em determinada posição, uma hidroxila em outra, um átomo de oxigênio ou de nitrogênio a mais, até obter substâncias causadoras de euforia, alucinações e dependência.

Algumas dessas drogas sintéticas já chegaram no Brasil, outras estão a caminho. São cada vez mais potentes, com efeitos colaterais mal conhecidos, eventualmente devastadores, que aumentam o risco de transtornos psiquiátricos irreversíveis e de mortes por overdose. Quando estiverem à disposição de grande número de usuários, sentiremos saudades dos tempos da maconha e da cocaína.

Se a equivocada política de guerra às drogas foi perdida contra a maconha, cocaína e heroína, com princípios ativos em plantas que exigem cultivo em áreas extensas localizáveis por satélites, laboratórios de refino e transporte em caminhões de carga, a polícia conseguirá impedir que entrem no país drogas sintéticas embaladas como medicamentos?

A cegueira dessa guerra de impacto desprezível no combate ao tráfico, que contribui para disseminar a violência urbana, superlotar cadeias, espalhar a corrupção e criar um Estado paralelo dominado pelo crime organizado, não tem a menor chance de enfrentar o desafio criado pelas drogas sintéticas do século 21.

Não sejamos ingênuos: a única estratégia de eficácia comprovada para reduzir os danos e combater o tráfico é diminuir as dimensões do mercado consumidor, tarefa árdua que exige recursos materiais, participação dos meios de comunicação em massa e empenho da sociedade na educação das crianças e no tratamento dos usuários crônicos.


Dráuzio Varella

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