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quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Compulsão e Pele



A alteração cutânea que tem ligação mais óbvia com processos mentais é a escoriação psicogênica. Trata-se de um quadro clínico composto por arranhões, feridas e crostas, que são provocados geralmente em áreas extensas da pele. O rosto, as mãos, os membros superiores e inferiores podem ser afetados. É característica do quadro permanecer o centro das costas sem lesões, porque não é alcançado pelas mãos com facilidade.

Não é realmente uma doença de pele, mas um estado criado pela pessoa, que a agride para liberar uma tensão que esteja vivenciando no momento. O fato mais notável neste quadro é que o paciente tem consciência de que está lesionando a pele, mas não consegue conter os movimentos, que vão gerar as escoriações e feridas.
Isso indica uma compulsão, isto é, um ato repetitivo praticado conscientemente e sem possibilidade de cessação pela vontade da pessoa.

Sintomas

As lesões são produzidas somente com as mãos, sem uso de nenhum objeto. São o equivalente de outros atos compulsivos, como roer as unhas, morder a mucosa dos lábios, arrancar cabelos, sobrancelhas ou cílios ou retirar a cutícula das unhas ou a pele das dobras periungueais (ao redor das unhas).
Geralmente os pacientes sentem coceira e, por isso, coçam-se violentamente. Às vezes, a coceira ocorre durante o sono e a pele é escoriada enquanto a pessoa dorme.
Muitas vezes, porém, não há coceira. A lesão é iniciada pela necessidade da pessoa de retirar pequenas alterações da pele ou pedaços de descamação cutânea, desencadeando-se o impulso de ferir a pele para o qual ela não tem explicação plausível.

Alteração mental

De certo modo, todas as pessoas fazem coisas semelhantes em momentos de tensão, como quando precisam concentrar-se numa tarefa, antes de uma prova ou entrevista, quando estão preocupadas com algo ou outras situações geradoras de estresse.

Nesses momentos, esfregam as mãos, coçam a cabeça, colocam a mão no rosto, batem com os dedos na mesa, contraem ou mordem os lábios, balançam uma perna. São atos que servem para eliminar a energia do estresse, mas não provocam alterações na pele e cessam assim que o estado interno é aliviado.

As pessoas com escoriações psicogênicas, porém, têm sempre algum distúrbio mental concomitante. Os mais freqüentes são depressão, transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade crônica e hipocondria. Às vezes, pode ser a pressão de fatores psicossociais ligados à família ou ao trabalho, que gera alto nível de estresse.

Essa relação foi demonstrada pelo psiquiatra turco Celal Çalikusu e seus
colaboradores em artigo publicado na revista Comprehensive Psychiatry, de maio/junho de 2003. Ele comparou 31 pacientes com escoriações psicogênicas com 31 pacientes com uma manifestação alérgica, a urticária, que serviram de grupo-controle.

Verificou que, no grupo com escoriações psicogênicas, a depressão foi o diagnóstico psiquiátrico associado mais freqüente (58% contra 6% no grupo-controle), seguido de transtorno obsessivo-compulsivo (45% no grupo com escoriações contra 9% no grupo-controle).

Além disso, a alta freqüência da depressão nos pacientes com escoriações psicogênicas sugeriu que a depressão não é apenas um sintoma associado, mas o estado clínico primário.

Tratamento

O tratamento exige o emprego de medicamentos antidepressivos e, ao mesmo tempo, psicoterapia comportamental. Esta tem a finalidade de levar o paciente a reconhecer a rotina do desencadeamento das crises e a criar comportamentos que evitem a auto-agressão.

À medida que a pessoa se torna consciente do que ocorre na sua mente, que conduz à cadeia de movimentos compulsivos, ela poderá talvez interferir no evento mental que dá origem ao problema e modificar o resultado final.

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