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sábado, 12 de novembro de 2011

Comportamento Violento




Segundo o italiano Lombroso, algumas pessoas SÃO normais e outras NASCEM predestinadas a serem criminosas ou "loucas". Na época, esse rígido Determinismo Biológico tentava oferecer ao mundo uma resposta sobre o problema das diferenças pessoais.

Não raramente, a sociedade humana tem grande dificuldade em admitir que essas pessoas pertençam ao mesmo grupo humano ordinário, preferindo-se acreditar que os loucos, tanto quanto os criminosos, são pessoas estranhas e biologicamente diferentes dos homens de bem, de nós mesmos e de nossas famílias.

Depois de muita polêmica, de muita execração do "politicamente incorreto", da repulsa ao determinismo biológico, modernamente ressurge a idéia da influência e importância do fenômeno neuroquímico no mundo psíquico. Assim sendo, tanto a loucura quanto crime, sua conseqüência literária e romântica, passam a representar uma interessante categoria de pessoas cuja conduta diferente e indisciplinada pode ser objeto de argüição eminentemente médica.

Falamos propositadamente de forma quase indissolúvel do binômio loucura-crime, procurando lembrar uma parte triste da história humana, onde os insanos e os criminosos eram reclusos juntos nas masmorras. Tanto um quanto outro, eram pessoas que representavam, exatamente, o comportamento desviante, diferente e indisciplinado. Não havia, então, uma maior preocupação científica, social ou simplesmente humana, de examinar a situação pessoal de cada um.

A psicopatologia, nesses últimos 20 anos, adquiriu conhecimentos que correspondem a 90% do que havia sido conhecido em toda história da humanidade em termos de neurofisiologia. Isso, evidentemente, repercute num substancial incremento sobre o entendimento acerca da pessoa humana e de seu comportamento.

A despeito desse conhecimento que explodiu na última década, a maioria das pesquisas ou não encontrou uma associação entre doença mental e o risco de cometer crimes de violência, ou encontrou apenas uma discreta associação, estatisticamente não significativa.

Por outro lado, os efeitos de álcool e drogas sim estariam associados à violência. Também pessoas portadoras de Transtorno de Personalidade Anti-Social estariam mais propensas ao crime (nem sempre violento e agressivo). Portanto, boa parte das pesquisas não encontrou diferença na prevalência da violência em doentes mentais sem abuso de substâncias, quando comparados com a população geral, sendo que o risco de violência em indivíduos da população geral com abuso de álcool ou drogas foi duas vezes maior do que em pacientes esquizofrênicos sem esse abuso. Finalmente, o maior risco de violência ocorre na combinação de abuso de álcool e/ou drogas com transtorno de personalidade anti-social.

O termo "agressão" possui tantas conotações que, na realidade, perdeu-se e diluiu-se seu significado. Embora seja conveniente conceber a violência e a agressão como processos comportamentais, por não se tratarem de conceitos simples e unitários não poderão ser definidos como tal, permanecendo difíceis de serem analisados isoladamente de outras formas do comportamento motivado.

Guardando inúmeras exceções, a tendência a agressão e a violência poderão ser concebidas como traços de personalidade, como respostas aprendidas no ambiente, como reflexos estereotipados de determinados tipos de pessoas ou até como manifestações psicopatológicas. Em nosso caso particular, interessa tratar a violência e a agressão como eventuais conseqüências de processos biopsicológicos subjacentes.

É impossível considerar a agressão no ser humano como um evento em si, emancipada das circunstâncias e contingências. Primeiramente, devemos considerar a agressão a partir do agente agressor, depois, a partir do agente agredido e, finalmente, a partir de um observador ou terceiro. Não surpreenderá encontrarmos três representações diferentes de um mesmo evento.

Do ponto de vista do agressor, deve-se considerar a intencionalidade dolosa do ato, ou seja, a tentativa intencional de um indivíduo em transmitir estímulos nocivos à outro. Para o agredido, deve-se considerar o sentimento de estar sendo agredido ou prejudicado e, quanto ao observador, deve-se considerar seus sentimentos críticos acerca da possibilidade de ter havido nocividade no ato em apreço, bem como sua intencionalidade (subjetiva) em promover a agressão.

Outro elemento a ser considerado é, inexoravelmente, se a violência está atrelada à agressão. Desta forma, podemos ter agressão com ou sem violência e, igualmente, violência com ou sem agressão. Uma mulher, por exemplo, pode sentir-se agredida pelo silêncio do marido, caso estivesse ansiosamente esperando por algum comentário ou diálogo, mesmo em se tratando de um comentário hostil.

O marido, por sua vez, deve ser consultado sobre suas intenções lesivas ao optar por uma postura silenciosa. Ele tanto poderia estar silencioso por desinteresse, por ser calmo e amistoso, quanto por ter planejado ferir a mulher através do silêncio. Neste último caso, estaríamos diante de um ato de agressão sem violência. A mesma cena poderia não ter um resultado agressivo, caso a mulher não se sinta agredida apesar da eventual intencionalidade agressiva do marido.

A violência, por sua vez, sugere a idéia de ação, de atitude dirigida especificamente para fins avassaladores. Os esportes, por exemplo, podem convocar a violência sem agressão ou a agressão sem violência. Convencionalmente, espera-se de um lutador de boxe uma boa dose de violência, mas que não demonstre intenção de agredir o adversário. Ele deve vencer seu adversário, não agredi-lo.

No mau futebol, por exemplo, podemos ter agressão dissimulada em jogadas habilidosas sem uma violência expressa. Um jogador ao bater uma falta, pode, propositadamente, acertar o rosto de um adversário na barreira e, já que isso é considerado parte das regras do jogo, não caracteriza um ato violento, embora seja intencionalmente agressivo.

A violência apresenta uma escalada muito superior ao aumento populacional e aos avanços, digamos, cívicos da sociedade. Mas, a criminalidade, propriamente dita, parece ter muito pouco a ver com a psiquiatria. Há, de fato, algumas poucas situações psiquiátricas acompanhadas de violência, notadamente aquelas conseqüentes a alterações cerebrais ou orgânicas. Por isso, tem sido um grande erro, por sinal um erro até agressivo, aceitar que a agressão e a violência sejam acompanhantes habituais da loucura.

Não precisa ser muito íntimo da psiquiatria institucional para saber que a expressiva maioria de episódios agressivos e violentos, acontecidos na lide com o paciente psiquiátrico, resulta da intenção agressiva da sociedade para com o louco e não o inverso. É a sociedade que o prende e tranca no hospício, é o pessoal da instituição que o amarra, seda-o excessivamente (às vezes), deixa-o despido, fere sua dignidade e assim por diante.

Márcio Amaral confirma em pesquisas que o crime e a patologia mental decididamente não andam juntos, conforme sugere o estereótipo cultural criado para a loucura. De um modo geral tem sido muito maior a agressão e a violência que a sociedade dispensa para com os doentes mentais do que destes para com aquela.

Hafner e Bocker realizaram na década de 80 um estudo epidemiológico acerca dos crimes de violência e distúrbios mentais. Levantaram os prontuários policiais e médicos de 10 anos na Alemanha, onde os índices de solução para crimes ultrapassa 95%, e concluíram dados muito interessantes. Um primeiro resultado curioso foi a proporção de criminosos com distúrbio mentais entre a população estudada: dos criminosos, apenas 2,97% tinha problemas mentais.

De posse dos dados, a dupla de pesquisadores calculou a probabilidade de um doente mental se tornar um criminoso violento. Para a esquizofrenia a probabilidade é de 0,05%, ou seja, 5 agressores violentos entre 10.000 esquizofrênicos. Para a psicose afetiva a probabilidade é de 0,006%, ou de 6 violentos em 100.000 doentes com esta patologia. Os autores terminam o trabalho concluindo que os crimes violentos cometidos por doentes mentais são quantitativamente proporcionais ao número de crimes de violência cometido pela população geral.

A incidência de crimes de violência entre os doentes mentais incluiu o suicídio, o que, de certa forma, reduz ainda mais a possibilidade de agressão à terceiros. Portanto, o senso comum que entende o doente mental como uma pessoa perigosa, só pode ser fruto de uma idéia preconceituosa e não científica.

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