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quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Helicobacter pylori: convivendo com o inimigo.


Helicobacter pylori é uma espécie de bactéria que infecta a mucosa do estômago humano. Muitas úlceras pépticas, alguns tipos de gastrite e de cancro do estômago são causados pela infeção por H. pylori, apesar de a maioria dos humanos infetados nunca chegar a manifestar qualquer tipo de sintomatologia e/ou complicação relacionada com a bactéria.

Estas bactérias vivem quase exclusivamente no estômago humano e duodeno, sendo o único organismo conhecido capaz de colonizar esse ambiente muito ácido, em parte pela sua capacidade de secretar urease, que transforma a ureia presente no ácido gástrico em amônia, elevando o pH ao redor da bactéria possibilitando sua colonização.

As bactérias têm formato de hélice (daí o nome helicobacter) e a forma espiralada permite-lhes "atravessar" com mais facilidade a camada de muco que protege o epitélio gástrico.

A evolução nos trouxe mais do que os genes humanos; com ela vieram os genes dos microrganismos que vivem em simbiose conosco. A esse conjunto de simbiontes damos o nome de microbioma.

Tidos no passado como simples parasitas de nossas entranhas, o microbioma hoje é considerado parte intrínseca da condição humana.

Enquanto um homem de 70 kg é formado por cerca de 70 trilhões de células, apenas em seu tubo gastrointestinal vivem pelo menos 100 trilhões de bactérias (!).

Até o fim do século 20, contávamos apenas com a bacteriologia clássica e os métodos de cultivo em tubo de ensaio para caracterizar os componentes do microbioma, metodologia que não nos possibilitou isolar mais do que um terço das bactérias nele presentes.

O Projeto Genoma nos trouxe técnicas de sequenciamento que permitem identificar os genes, sem a necessidade de preparar meios de cultura para bactérias desconhecidas e exigentes.

Os resultados desses sequenciamentos mostraram que, enquanto herdamos dos pais 20 a30 mil genes, existem em nosso organismo 3 milhões de genes bacterianos.

Na verdade, o que chamamos de corpo humano é um ecossistema, atualmente analisado com ferramentas muito semelhantes às dos ecologistas que estudam florestas ou o fundo do mar.

Para ilustrar as interações entre o microbioma e os órgãos humanos, vamos citar o caso de uma bactéria que os australianos Barry Marshall e Robin Warren descreveram na década de 1980: o Helicobacter pylori, uma das únicas capazes de sobreviver no meio ácido do estômago.

O isolamento dessa bactéria, presente em mais da metade da população mundial, foi seguido da demonstração de que ela estava envolvida no mecanismo de formação das úlceras e de alguns tipos de câncer do estômago.

A partir desses achados virou rotina tratar úlceras e até certos casos de câncer gástrico com antibióticos.

Os resultados foram animadores: em pouco tempo a incidência de úlceras nos países desenvolvidos caiu mais de 50%. Estudos posteriores, no entanto, revelaram que a realidade era mais complexa.

Em 1998, Martin Blaser, da Universidade de Nova York, publicou um trabalho demonstrando que, na maioria das pessoas, o H. pylori não era um parasita vulgar, mas um comensal que para sobreviver regula a concentração local de ácido. Quando o suco gástrico está excessivamente ácido, ocorre ativação do gene cagA do Helicobacter, que controla a síntese de proteínas capazes de reduzir a liberação de ácido pela mucosa gástrica.

Infelizmente, essa atividade tem o inconveniente de provocar ulcerações, em pessoas suscetíveis.

Dez anos mais tarde, Blaser demonstrou que o H. pylori também exerce outras funções. Há anos sabemos que o estômago produz pelo menos dois hormônios envolvidos no apetite: a grelina, que avisa o cérebro quando chega a hora das refeições, e a leptina, que o avisa quando o estômago está repleto (entre outras atividades).

O H. pylori participa da regulação da quantidade de grelina produzida quando o estômago se distende. Erradicá-lo comprometeria um dos mecanismos de controle do apetite.

Em outro estudo, o grupo de Blaser comparou 92 pacientes tratados com antibióticos para eliminar o Helicobacter, com um grupo semelhante deixado sem tratamento.

Os que tiveram a bactéria erradicada ganharam mais peso, provavelmente porque produziram menos grelina e sentiram mais fome.

O autor faz a seguinte afirmativa: “Duas ou três gerações atrás, mais de 80% dos americanos eram portadores de H. pylori. Hoje menos de 6% das crianças carregam a bactéria no estômago. Temos uma geração inteira crescendo sem Helicobacter para interferir com a produção de grelina e o apetite”.

Entramos na era de descobertas que abrirão caminho para entender as funções dos microrganismos com os quais dividimos nosso corpo e a importância crucial que eles têm na evolução, desenvolvimento, metabolismo, defesa imunológica e suscetibilidade às infecções e às doenças degenerativas.

A Helicobacter pylori é uma bactéria de forma espiral, Gram-negativa, microaerófila, associada exclusivamente a células da mucosa gástrica, sendo agente causador da gastrite crônica, úlcera péptica e duodenal e está associada com o incremento do câncer e linfoma gástricos.

A infeção gástrica causada por H. pylori é considerada a mais comum das infeções humanas.

A maioria dos estudos sugere que homens e mulheres são infectados igualmente por H. pylori.

A hipótese mais aceita sobre o modo de transmissão desta bactéria é diretamente de pessoa para pessoa através da via oral-oral e fecal-oral.

Portanto, ela não é "contagiosa", mas "transmissível".

A H. pylori tem sido encontrada na saliva, placa dentária e fezes, demonstrando que as cavidades oral e fecal estão possivelmente envolvidas na transmissão da bactéria.

Além disso, sua presença no suco gástrico indica a possibilidade de transmissão oral-oral (beijo, por exemplo).

A presença de H. pylori no suco gástrico de pacientes infectados sugere que o vômito e o refluxo esofágico possam ser considerados como um meio de propagação do microrganismo.

Desse modo, propõe-se uma maior atenção a possível transmissão gastro-oral, que ocorreria quando um indivíduo entrasse em contato com vômito contaminado.

A prevalência da infeção por H. pylori varia muito por área geográfica, idade, raça e está intimamente relacionada com condições socioeconômicas e sanitárias.

Os sintomas decorrentes da doença gástrica surgem na vida adulta, entretanto a aquisição de H. pylori ocorre na infância.

A bactéria está presente em mais da metade da população mundial, sendo que mais de 30% da população dos países desenvolvidos e mais de 80% dos indivíduos que vivem nos países em desenvolvimento são portadores desta bactéria.

A infeção pode ser sintomática ou assintomática (não apresenta os sintomas da doença).

Estima-se que até 70% das infeções são assintomáticas e que aproximadamente 2/3 da população mundial são infetadas pela bactéria, tornando-se a infeção mais difundida no mundo.

Taxas de infeção atuais variam de nação a nação – o ocidente (Europa Ocidental, Norte América, Australásia) apresentam taxas ao redor 25% e sendo muito mais elevado em países em desenvolvimento.

Além do mais é comum, provavelmente devido às pobres condições sanitárias, achar infeções em crianças.

Testes para diagnóstico da infeção por H. pylori incluem métodos invasivos e não invasivos.

As técnicas utilizadas podem ser diretas, que demonstram a presença da bactéria por cultura ou microscopia, ou indiretas, utilizando urease, antígenos nas fezes ou uma resposta de anticorpos como um marcador da doença.

O diagnóstico de H. pylori é realizado, geralmente, por testes invasivos, como a análise histológica de biópsias obtidas durante exame endoscópico, a qual também permite a avaliação da mucosa gástrica.

Os testes não invasivos incluem o teste sorológico, teste respiratório da ureia e o teste de excreção urinária da amônia.

Estes não requerem a endoscopia, porém a dificuldade da preparação de antígenos específicos da bactéria e a presença de bactérias que hidrolisam ureia na cavidade oral diminuem a especificidade e a sensibilidade do diagnóstico.

Portanto, os métodos não invasivos são indicados para o diagnóstico após tratamento da infeção para verificar a erradicação da H. pylori.

A infeção por H. pylori persiste pela vida, ao menos que tratada com terapia antibacteriana.

A cura da infeção por H.pylori resulta na cicatrização da úlcera e na potencial redução do risco de câncer e linfoma gástricos.

Os índices de erradicação de H. pylori após antibioticoterapia estão próximos de 80%, variando de país para país e regionalmente, dentro dos países.

Uma vez detectada a H. pylori na mucosa do estômago de pacientes com doença gástrica, o tratamento indicado consiste em regime triplo ou quádruplo, incluindo os antibióticos metronidazol, claritromicina, amoxicilina ou tetraciclina e um inibidor de bomba de próton como omeprazol, lansoprazol ou pantoprazol56 .

Ainda não há um regime padrão para tratamento da infeção por H. pylori, sendo frequente a ocorrência de indivíduos que não respondem aos medicamentos, mantendo a infeção.

Vários fatores contribuem para essa baixa taxa de cura após tratamento da infeção por H. pylori incluindo a ineficiência da penetração do antibiótico na mucosa gástrica, a inativação do antibiótico pela secreção ácida do estômago, a falta de adesão do tratamento pelo paciente e principalmente, casos emergentes e aumento de cepas de H. pylori resistentes a antibióticos.

O estilo de vida também pode influenciar na extensão da infeção por H. pylori e no tratamento.

Um estudo realizado na Alemanha sugere que o consumo de álcool pode ser um protetor contra a infeção pelo patógeno em questão.

A prevalência da infeção diminuiu significativamente entre pessoas que bebiam mais que 75g de etanol por semana comparado com pessoas que não faziam uso de tal quantidade.

A bebida alcoólica estimula a secreção de ácido e o esvaziamento gástrico e, portanto, não permite a instalação da H. pylori na mucosa gástrica.

O estudo alemão também evidenciou uma alta taxa de infeção (20%) entre pessoas que ingerem três ou mais copos de café por dia.

Além disso, as taxas de infeção também são significativamente altas entre fumantes (25 %) comparados aos não fumantes (18 %).

Há muito mais para colocar sobre este nosso adversário, mas creio que estas informações são as mais fáceis e importantes. Com o tempo vamos nos atualizando.

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